O que as tradições da Índia podem nos ensinar sobre os cuidados no pós-parto às novas mães e recém-nascidos?
Na Índia, ao longo das culturas, é dada muita ênfase no período pós-parto. É um período destinado para a recuperação da mãe após o nascimento e para a criação do vínculo mãe-bebê. Também é período em que ambos estabelecem a amamentação. Após o parto, as mulheres permanecem em casa por, aproximadamente, seis semanas/40 dias (um período de confinamento).
Geralmente, a mulher volta à casa de sua mãe para o fim da gestação, parto e pós-parto. Se ela não puder, então a mãe virá e ficará com ela durante esse período. Essa prática é, de fato, benéfica para uma nova mãe, que vai precisar ser, ela mesma, “maternada”.
Da nova mãe, espera-se apenas que descanse, rejuvenesça e se recupere. E não que faça tarefas domésticas ou quaisquer outras atividades que demandam muito dela. Basicamente, ela deve ser mimada com amor por todo o próximo mês, no mínimo. Ela está num tipo de dieta, que é especificamente adaptada para as necessidades de seu corpo no pós-parto. Simran Adeniji, Educadora Perinatal, escreve:
“Na Ayurveda, uma tradição indiana de cura de 5000 anos, esse período é considerado um momento sensitivo para as mães, particularmente para o sistema digestivo – daí a forte ênfase em comidas simples e de fácil digestão. Tradicionalmente, as mães recebem massagens com óleos quentes diariamente. Elas são alimentadas com comidas muito simples, porém especiais e bebidas de ervas para promover a cura, aumentar sua imunidade e aumentar a produção de leite”.
Alimentação e Nutrição
Por curiosidade, vamos dar uma olhada em como podem ser essas orientações dietéticas (conforme artigo de Anita Premkumar):
“Aperitivos feitos de sementes de gergelim, nozes secas, sementes de feno-grego, alho, varetas e sementes de carambola são dados às recém-mães para aumentar a produção de leite. Também se dá goma comestível feita com nozes secas e trigo para fortalecer as costas e os órgãos reprodutivos no pós-parto. Leite de vaca fresco é a primeira coisa dada pela manhã para reforçar a qualidade do leite da nova mãe.”
Leguminosas como feijões, abóbora, cenouras, beterraba, folhas verdes, pepino são cozidos em ghee (manteiga clarificada) a fim de nutrir o corpo e facilitar as evacuações. Lentilhas, cereais e grãos integrais são temperados com especiarias e servidos quentes.
Legumes gasosos como couve, couve-flor e batatas são evitados para as três primeiras semanas após o parto, uma vez que eles desarmonizam os cinco elementos corporais e perturbam o sistema digestivo. Sobras de comidas são evitadas e é dada preferência a alimentos orgânicos.
A nova mãe é orientada a comer no tempo certo e nem muito nem pouco, de modo que o sistema digestivo não fique sobrecarregado. Mastigar folhas de betel depois da refeição ajuda na digestão.
Em adição a uma dieta específica, também é dado à nova mãe uma série de tônicos ayuvérdicos como Sukumara kashayam para ajudar nas contrações uterinas e área pélvica, Ajamamsa rasayanam para fortalecer os ossos e músculos e Dashamoola arishtam para aumentar a imunidade e reforçar a qualidade do leite materno, ao longo de três meses.
“Minhas tataravós e seus descendentes viveram até o auge dos 90 anos o mais, apesar de darem à luz a mais de 10 crianças. Elas não tinham as reclamações mais comuns de reumatismo, artrites, dores nas costas, nas juntas, etc., porque elas seguiram estritamente as práticas de resguardo tradicionais…
Por isso, minha mãe disse (e tendo a acreditar) que algumas mulheres da minha geração e das gerações posteriores foram acometidas com dores crônicas, doenças pélvicas e nas juntas, desde o momento que suas crianças ainda estavam na pré-escola, por conta de uma atitude de desatenção e ceticismo em relação aos dogmas e às práticas antigas.
É possível perceber que a maioria de seus problemas de saúde atuais estão relacionados à falta de cuidados no período pós-parto, por não perceberem que as seis primeiras semanas após o nascimento são uma fase crucial na vida da mulher, bem como a ciência médica também concorda que leva, no mínimo, seis semanas para a mulher se recuperar física e mentalmente.”
Massagens mornas e banhos no pós-parto
Como sabemos, a alimentação pós-parto é um ponto decisivo, mas vamos dar uma olhada em algumas outras práticas, tão importantes na cultura Indiana. Essas mulheres recebem diariamente massagens com óleos quentes seja por um membro da família ou um “maushi” ou “dai” experiente. Essas massagens são feitas com óleos estimulantes como gergilim, côco, oliva, etc, como aprendemos com Geetu Vinod abaixo e são seguidas de um banho quente de ervas.
Óleo de Gergelim (til ka tel)
Óleo de Gergelim é utilizado para massagens em muitas regiões da Índia, especialmente em Maharashtra. Acredita-se que controla o stress e pressão sanguínea e tem propriedades de resfriamento.
Óleo de Côco (nariyal ka tel)
É usado, geralmente, para massagens faciais. Ele dá um efeito refrescante e hidratante ao corpo. Quando aplicado na barriga de gestantes, reduz a aparição de estrias por funcionar como hidratante natural. O óleo de coco tem um cheiro agradável e é absorvido pela pele rapidamente.
Azeite (jaitoon ka tel)
O azeite tem sido cada vez mais utilizado em muitas regiões, especialmente em áreas urbanas. É bom para a pele e cabelo. Em caso de cesárea, massagens com óleo só são feitas após a cicatrização dos pontos.
Banhos
Após a massagem com óleo, é utilizada água quente para o banho. Ela é derramada sobre o abdome e a área pélvica.
Usa-se água quente fervida com folhas de nim para banhar outras partes do corpo. Folhas de nim são um antisséptico natural. Água morna pode aliviar músculos cansados e doloridos. Sabonetes comerciais são evitados para não tirarem o óleo corporal. A pasta de farinha de grão de bico misturada com uma pitada de açafrão e uma colher de chá de creme de leite é usada como sabonete para a mãe e o bebê.
Amarração de Barriga / Belly Binding
Após o banho, a barriga é “amarrada” com um sari de algodão ou tecido. Acredita-se que isso ajuda a contrair o útero e mantê-lo no lugar. A amarração de barriga também ajuda a se livrar dos gases no estômago.
Alguns benefícios da amarração de barriga são:
- promove uma postura saudável durante a amamentação
- gentilmente empurra os músculos do estômago de volta ao lugar;
- reposiciona o ovário e reduz estrias;
Cobrir a cabeça
Após o nascimento, as mulheres devem cobrir a cabeça com um lenço o dia todo como parte da tradição norte-indiana. Acredita-se que o calor do corpo é perdido, primeiramente, pela cabeça e que a nova mãe deve preservar seu calor corporal para a recuperação. Acredita-se que cobrir a cabeça te manterá quente e protegida das infecções.
Restrições impostas durante o período de resguardo
Algumas poucas restrições são aconselhadas às novas mães do norte da Índia como parte dos cuidados no pós-parto. Acredita-se que seguir essas restrições ajudará a mãe a evitar problemas de saúde como dores nas costas, na cabeça e no corpo mais tarde:
- evitar ar condicionado ou ventilador, pois podem provocar resfriados nas recém-mães;
- nada de leituras ou TV (para evitar dores de cabeça);
- nada de gritos, choros ou entrar em conversas estressantes;
- nada de fazer trabalhos domésticos;
- ficar num cômodo até o fim do período de resguardo;
- dormir quando o bebê dormir (melhor conselho!).
Cuidados com o recém-nascido
Cuidados com o recém-nascido são grandemente enfatizados também. As mães são ensinadas a fazer massagens em seus bebês diariamente e encorajadas a amamentar em livre demanda. Essas primeiras semanas da maternidade não são só importante para a saúde da mãe e do bebê, mas um momento maravilhoso para eles criarem laços e estabelecerem uma relação cheia de amor.
Conforme o bebê cresce, a cada poucas semanas há um ritual, uma realização festiva. A cerimônia de nomeação (literalmente de dar o nome ao bebê), a primeira vez que o bebê vai passear, a cerimônia de cortar o cabelo e outras cerimônias para sua proteção, saúde e longevidade.
Depressão pós-parto
Na Índia, a abordagem holística no período pós-parto age como um preventivo para a depressão pós-parto. A rede de apoio à mãe deve ser acolhedora e apoiar de tal forma que ela possa obter toda ajuda e afeto que precisa para se curar e recuperar após o parto física e emocionalmente.
Com os devidos cuidados, uma mãe também poderia ir mais fundo e conseguiria os recursos mentais, emocionais e espirituais necessários para prosseguir através das demandas da vida familiar sem se sentir esgotada.
Este texto é um artigo escrito por Maya D’Costa, na altura aluna do Birth Institute, cuja versão original está disponível no site Birth Institute). Tradução livre feita por Aline Rossi.
Bibliografia e referências: